sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Sem direito ao luto, mães e pais que perderam seus bebês sofrem com o não reconhecimento de sua dor

fonte: http://sites.uai.com.br/app/noticia/saudeplena/noticias/2015/08/19/noticia_saudeplena,154696/sem-direito-ao-luto-maes-e-pais-que-perdem-seus-bebes-sofrem-com-o-na.shtml



Documentário 'O Segundo Sol', produzido pelo casal Fabrício Gimenes e Rafaella Biasi após a perda de Miguel na 40ª semana de gestação, chama atenção para a falta de preparo dos serviços e profissionais de saúde para lidarem com as perdas gestacionais e neonatais. Lançamento está previsto para novembro


“Eu quero parir essa perda. Quero me despedir do meu filho”. A frase foi ouvida pelo publicitário Fabricio Gimenes, 25 anos, logo após ele e a esposa, a modista Rafaella Biasi, 33 anos, descobrirem que o filho Miguel estava morto dentro do útero da mãe. O casal que vivia o final da 40ª semana de gestação acabara de chegar ao consultório do especialista que acompanhava aquela gravidez. Rafaella já estava com 4 cm de dilatação, sentia as primeiras contrações e se preparava para um parto normal. Após uma gestação inteira sem nenhuma intercorrência, mas muitos planos e sonhos para quando chegasse o irmão de Cecília, de 12 anos, o casal foi surpreendido pela morte quando, na verdade, esperava pela vida. A notícia avassaladora foi apenas o início de uma dor que pode se mostrar ainda mais cruel. Isso por que os serviços e profissionais de saúde, assim como pais, amigos e familiares, não estão preparados para lidar com as perdas gestacionais e óbitos neonatais. Os sentimentos de solidão e incompreensão dificultam ainda mais o luto de quem perde um bebê, um ser humano que estabeleceu vínculo forte com os pais, mas que não existiu para os outros. 


“Foi terrível, às 11h chegamos ao consultório animados, às 12h saímos desnorteados para dar entrada no hospital. Miguel nasceu às 23h. Eu não conseguia processar nada. O parto foi um momento triste, mas também muito bonito. Foi um dos momentos mais intrigantes das nossas vidas. Eu pensava, ‘está todo mundo errado e o Miguel vai chorar na hora que sair’. Quando ele nasceu, a Rafaella o pegou no colo, colocou no peito e eu só consegui dizer ‘obrigado, meu filho, pelas transformações que vieram até agora e pelas que virão daqui para a frente’. Nós tivemos a oportunidade de nos despedir, temos uma foto com o nosso filho, mas não é o que acontece na grande maioria dos casos”, afirma Fabricio Gimenes, idealizador, junto com a esposa, do documentário 'O Segundo Sol' que vai contar a histórias de superação das famílias que perderam seus bebês e tem estreia prevista para novembro.

É o caso da consultora de beleza, Raquel Fernandes, 37 anos, que perdeu Gustavo Henrique na 35ª semana de gestação, há 10 anos. “Tive descolamento de placenta e corria risco de morrer”, explica. Como precisou passar por uma cesariana de urgência, quando o médico sugeriu que ela se despedisse do filho com um beijo, ela se negou. “Eu me arrependo até hoje. Eu estava em choque, não vi o Gustavo, não pude vesti-lo. Eu gostaria que tivessem me explicado que era importante, que tivessem insistido, que tivessem me oferecido novamente”, diz.

Raquel conta que, na tentativa de superar a perda e suportar a dor, começou a trabalhar muito. “Fui engolindo a dor. Depois de um ano, tudo explodiu. Eu sentia dores por todo o corpo, nos braços, nas pernas e fui diagnosticada com depressão profunda. Foi aí que percebi que tinha que conversar sobre o assunto, que eu tinha necessidade de falar”, diz.

Para Rafaella Biasi, que teve a oportunidade de se despedir do filho Miguel, é papel do profissional de saúde oferecer à mãe a chance de se despedir do filho ou da filha. Ela diz que, quando chegou em casa depois da partida de Miguel – após uma temporada de uma semana na fazenda da família -, se sentiu extremamente sozinha. “A solidão me motivou a procurar ajuda na internet e descobri que as famílias não tiveram o mínimo de acolhimento e amparo. Muitas mulheres relatam que foram vítimas de violência obstétrica. Nessas conversas, percebi que existe muito ressentimento, muita culpa, muito pesar, arrependimento de não ter tido a possibilidade de ver o bebê pela inabilidade do médico em oferecer. Nessa hora, a mulher não tem condição de tomar essa decisão. Vi que não ter pegado o filho no colo machucava demais, é uma corrente que se arrasta por toda a vida”, narra.

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